Uma tardezinha, por volta das 17h00, um café com pão caseiro faz o cenário perfeito para a entrevista com os pioneiros de Ivaiporã João Bernardo Fraga, 82 anos, e sua esposa Luzia Bavati Fraga, 78 anos.
Fazer pães caseiros para o consumo próprio, uma vez por semana, é a tradição da família Fraga, que chegou ao Paraná no dia 14 de outubro de 1950, na cidade de Apucarana, na época, último ponto da estrada de ferro. Ali apearam os mineiros José Pedro Fraga, a esposa Mariana Clara Fraga e mais 7 filhos (Joaquim, João, Maria, Helena, Pedro, Daniel e José).
Vinda da cidade de Pouso Alegre (MG), a família desembarcava para tentar construir um novo futuro e, passados 72 anos, os Fragas constituíram-se num grande e forte clã, que ajudou muito na colonização de São João do Ivaí, Jardim Alegre e Ivaiporã.
Atualmente, um dos filhos do mineiro José Pedro, seu João Bernardo Fraga e a nora Luzia Bavati Fraga, depois de criarem 5 filhos em Ivaiporã, contam um pouco dos sacrifícios passados nos quase 61 anos dessa saga da família, que iniciou a colonização da região central em meados do século passado. Dessa história nasceu a filha e jornalista Nair Fraga do Amaral que, juntamente com Miguel Roberto do Amaral, fundaram o jornal Paraná Centro, que completa 30 anos de fundação no dia 6 de janeiro de 2023.
Paraná Centro - Por que seus pais resolveram sair de Pouso Alegre (MG) e vir para o Paraná?
João Fraga - Depois de uma crise e frustração de safra, as coisas ficaram difíceis para meu pai, em Pouso Alegre. Ele tinha uma fábrica de polvilho, em 1946, e, após a segunda grande guerra mundial, meu pai teve que vender a propriedade rural para cumprir compromissos de compra antecipada de produtos agrícolas para a fábrica de farinha, que tiveram grande alta no mercado. Depois de vender o sítio de 5 alqueires, que ficava num distrito, mudamos para o centro da cidade de Pouso Alegre.
Paraná Centro - Como foi a viagem?
João Fraga - Foi em 1950, quando eu estava com 10 para 11 anos de idade. Lembro que pegamos o trem para Campinas (SP), e chegando em São Paulo viemos pela imigração (sem pagar) até Ourinhos (SP). De Ourinhos, meu pai comprou passagens e viemos de trem para Apucarana (PR), quando chegamos com uma troca de roupa para cada um, que estavam em sacos, e trouxemos as panelas em caixas.
Paraná Centro - Que data chegaram em Apucarana e de lá foram para onde?
João Fraga - Chegamos em Apucarana e fomos para a cidade de Mandaguari, para encontrar um tio do meu pai, de nome Antônio Fraga. Ficamos lá e esperamos duas semanas até o caminhão ir nos buscar para levar a uma cerâmica em Paiçandu, onde ficamos dois anos trabalhando para um homem chamado Valdemar Barbudo.
Paraná Centro - De que veículo foram de Apucarana para Mandaguari?
João Fraga - Fomos de “jardineira” (ônibus). Lá, na cerâmica, eu trabalhava tirando rebarba das telhas, aos 10 anos, foi o primeiro serviço que eu tive na vida. Eu trabalhava com uma faca para tirar as sobras que ficavam da prensa manual. Eu disputava com adultos quem fazia mais e, às vezes, eu ganhava. Minha mesa era um caixote de querosene.
Paraná Centro - Ficaram em Paiçandu de 1950 até 1952, e depois?
João Fraga - Fomos para Bom Sucesso, porque meu pai não gostava de trabalhar de empregado, queria trabalhar por conta. Fomos para uma propriedade para formar lavoura de café. Lá plantamos café e, por quatro anos, tudo que produzisse era nosso. Produzíamos arroz, feijão e tudo que podia para vender e comer.
Paraná Centro - Para viver dava?
João Fraga - A casa era boa para morar e o que produzíamos a mais levávamos para vender na cidade. Depois, ainda em Bom Sucesso, nasceram mais dois irmãos e ambos morreram. Logo depois, nasceu a caçula Ana Tereza.

Paraná Centro - Como era seu pai?
João Fraga - Meu pai era estilo militar, o que é certo era certo.
Paraná Centro - Vocês ficaram em Bom Sucesso até que ano?
João Fraga - Até 1957, quando íamos sair, deu uma grande geada. Então, o proprietário da terra deu mais um ano para nós.
Paraná Centro - E a dona Mariana Clara, sua mãe, como era?
João Fraga - Era trabalhadeira, mas teve uma etapa que sofreu muito com bronquite, por uns dez anos, precisou que minhas irmãs fizessem o serviço da casa. Mas sempre trabalhou e apoiou meu pai e a nossa família.
Paraná Centro - Vocês arrendaram uma propriedade em São João do Ivaí. Como se deslocavam para lá?
João Fraga - Sim, em 1957, pegamos uma empreita de 6 anos para formar café e viver da produção de outros produtos da terra. Nessa época, deu umas enchentes e não tinha ônibus. Nós vínhamos de ônibus até São Pedro do Ivaí e depois andávamos 25 quilômetros, a pé, até São João do Ivaí. Fizemos muitas vezes esse trajeto, o que levava umas quatro horas.
Paraná Centro - Como foi na propriedade de São João do Ivaí?
João Fraga -No começo, iam só os homens e construímos uma casa de palmito. Depois de um ano, já tínhamos uma casa de madeira boa e trouxemos toda família.
Paraná Centro - Como formaram o sítio de São João do Ivaí e onde moravam?
João Fraga - Nos 15 alqueires, o que deu formamos café e na outra parte era pasto.
Paraná Centro - E o casamento com a dona Luzia, quando e como aconteceu?
João Fraga - Eu já conhecia a Luzia Bavati desde Bom Sucesso. Depois, nós viemos para São João e eles (família Bavato) foram morar em Jandaia do Sul, até que os pais dela compraram uma propriedade perto da nossa, em São João do Ivaí. Daí começamos a namorar e casamos em 1962, no Cartório de Registro Civil de Guaretá, atualmente distrito de Lunardelli. Depois, o casamento religioso foi na Igreja Bom Jesus de Ivaiporã, que na época era de madeira.
Paraná Centro - Como aconteceu a compra da propriedade rural na Barra Preta?
João Fraga - Em São João, meu pai gostava de mexer com gado, produzir cereais e fomos ajuntando um dinheiro, até que, em 1963, deu para comprar um sítio de 20 alqueires, no distrito da Barra Preta, no município de Jardim Alegre. Aí veio toda família para o sítio de Jardim Alegre.
Paraná Centro - Foi difícil abrir o sítio na Barra Preta?
João Fraga - Tivemos que abrir o sítio da Barra Preta na foice, no machado e na serra, cortando árvores e destocando para plantar. Era só mato e fomos derrubando uma verdadeira floresta. Só tinha estrada que a Companhia Ubá fazia nas cabeceiras do sítio, mas dentro da propriedade era só mato, onde abríamos os carreadores no braço.
Paraná Centro - Era difícil a vida com uma família grande, que já tinha quatro irmãos casados e três solteiros, todos numa só propriedade?
João Fraga - Não! Porque com meu pai era disciplina de exército, além disso, a gente era unido. Como não tinha rádio e televisão era só conversar. Hoje em dia não tem mais tanta união nas famílias.

Paraná Centro - E depois, como o senhor veio para Ivaiporã?
João Fraga - Em 1967, eu e meu irmão Joaquim compramos, em sociedade, 10 alqueires na comunidade da Paineirinha, no distrito de Jacutinga, no município de Ivaiporã. Nessa época, eu e a Luzia já tínhamos três filhos: Neide, Sidnei e a Neusa. Daí, em 1969, já em Jacutinga, nasceu a Nair. Depois, em 1981, chegou o Antônio, com 5 anos, para completar os 5 filhos.
Paraná Centro - Como o senhor ia do centro de Ivaiporã para Jacutinga?
João Fraga - No começo ia a pé para Jacutinga e, de vez em quando, a ia de jipe taxi. Mas, em 1970 vendi umas criações e comprei um jipe, ano 1959, para atender a família. Servia para mim e meu irmão. Daí, meu pai faleceu em Jardim Alegre e meu irmão Joaquim, que é o mais velho da turma, teve que ir cuidar da propriedade para minha mãe.
Paraná Centro - Por que o senhor decidiu vir para Ivaiporã?
João Fraga - Teria que pagar a parte dele (Joaquim) no sítio e também queria trazer meus filhos para a cidade, para estudarem. Como conseguir ficar no sítio, com três filhas mulheres e um menino, que nasceu muito franzino, para trabalhar na lavoura? Além disso, não queria que meus filhos crescessem no cabo da enxada e sem estudos.
Paraná Centro - Quando vocês mudaram para Ivaiporã?
João Fraga - Em 1971, conseguimos vender o sítio e trocamos em duas casas, uma no Jardim Alegre e outra na Rua São Luiz, onde estou até hoje. Chegando aqui, comprei um veículo Vemaguet, para trabalhar no taxi. Depois troquei a Vemaguet num corcel.
Paraná Centro - No taxi dava uma renda suficiente para tratar da família?
João Fraga - Não dava, apesar de eu trabalhar 18 horas por dia. Aí, em 1977, fui trabalhar na Prefeitura de Ivaiporã, com indicação do meu amigo Otávio Valoto, que já trabalhava lá e, quando surgiu a vaga de motorista, me avisou.
Paraná Centro - E na Prefeitura de Ivaiporã, o que fez e por quais prefeitos trabalhou?
João Fraga - Entrei na gestão do Dr. Manoel Fernandes Silva, em novembro de 1977. Fazia viagens para Londrina e Curitiba, às vezes passava a noite e não ganhava hora extra. Saí da Prefeitura na gestão do Dr. Melvis Muchiuti, em 1996, quando me aposentei.
Paraná Centro - Qual lembrança o senhor tem da viagem mais difícil que fez, quando trabalhava para a prefeitura?
João Fraga - Passei apuro muitas vezes, porque os ônibus eram muito ruins. Teve uma viagem que fui levar a fanfarra de Ivaiporã, por volta de 1997, para tocar em Foz do Iguaçu, e fui sem outro motorista reserva. Viajamos a noite toda, chegamos às 5 horas da manhã; às 11h00 horas a fanfarra tinha que tocar. Terminou a apresentação às 14h30, fomos para o alojamento e o pessoal quis ir ao Paraguai. À noite voltamos para Ivaiporã e acabei dirigindo por quase 24 horas sem parar. Vim rezando porque não via muito bem a estrada e cheguei quase caindo de sono. Essa foi uma das aventuras.
Paraná Centro – Agora aposentado, como vê a evolução da família e valeu a pena ter trocado o sítio pela cidade?
João Fraga – Sim, valeu muito a pena. Temos uma vida tranquila, desfrutando da companhia dos filhos, netos e bisnetos. Tivemos o privilégio de ver nossos filhos formados, seguindo a carreira profissional que escolheram, e também meus netos, praticamente todos formados em faculdade, só falta a neta caçula Heloísa que está no ensino fundamental. Já temos 4 bisnetos e esperamos que venham mais.
Paraná Centro - Qual a mensagem do casal para o aniversário de 61 anos de Ivaiporã?
João Fraga - Desejo muita paz, vida e saúde para todo nosso povo. Para Ivaiporã peço que continue sendo essa terra abençoada que nos deu tanta alegria.
Dona Luzia – Muitas felicidades para todo o povo e que Ivaiporã continue sendo essa terra maravilhosa.
